André: O que você pensa sobre tecnologias que têm mais de 60 anos? Elas são ultrapassadas? E se você soubesse que o mundo só funciona como conhecemos por conta dessas tecnologias?
Meu nome é André David e teremos a oportunidade de conversar com Denis Pereira, da IBM, para entender mais sobre o mundo dos mainframes e COBOL.
Audiodescrição: André é um homem branco, de cabelo curto cacheado castanho-escuro, olhos castanho-escuros, e barba curta castanho-escura. Ele veste uma camisa preta, usa óculos de armação retangular preta, um relógio vermelho, e está sentado em uma poltrona cinza à esquerda no estúdio da Alura, com uma parede clara ao fundo iluminada em gradiente rosa e azul. Há uma mesa de madeira encostada na parede contendo enfeites.
Denis: É um prazer estar aqui conversando sobre essa tecnologia que, apesar de ter 60 anos, continua sempre nova. Eu tenho 60 anos e trabalho com isso há 40. Será um prazer explorar um pouco desse mundo para que todos possam conhecê-lo.
Audiodescrição: Denis é um homem branco, de cabelo grisalho curto e cacheado, e olhos castanho-escuros. Ele usa óculos de armação retangular preta, veste uma camisa preta com o logotipo da IBM em branco, e está sentado no mesmo ambiente de estúdio à direita.
André: Quando falamos de mainframe e COBOL, parece algo distante da realidade, apesar de estar presente em tudo que vemos. Gostaria de começar o papo de forma introdutória, tentando entender algumas das intenções por trás dessas tecnologias.
Quando o COBOL surgiu, por exemplo, qual problema se tentava resolver? Era a necessidade de conseguir conversar com a máquina e definir padrões? Até a Grace Hopper estava envolvida na história. Você pode nos contar um pouco sobre isso?
Denis: O COBOL nasceu em 1959, impulsionado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos, que queria uma linguagem fácil para transacionar questões do dia a dia financeiro, sistemas de RH e contabilidade. A ideia era criar uma linguagem fácil de ler e escrever, que permitisse programar e produzir os resultados desejados de forma simples.
O COBOL é muito próximo do inglês. Por exemplo: para ler um arquivo no COBOL, usamos READ
; para deletar um registro, DELETE
; para regravar um registro, REWRITE
. Assim, rapidamente, é possível entender o que foi feito em um programa.
Inicialmente, o COBOL era muito voltado para processamento em lote (batch), mas agora é muito mais online, devido à interação digital mais forte, como no caso do PIX e consultas. No entanto, é o mesmo COBOL que desempenha esses papéis.
André: É interessante mencionar que, apesar de haver uma demanda importante na época, ela era muito menor do que a demanda atual. Mesmo o processamento de órgãos públicos, por exemplo, tinha um volume que, comparado ao de hoje, parece pequeno.
Onde está o COBOL hoje e que tipo de problemas ele resolve atualmente?
Denis: Um exemplo bem atual que todos podem entender é o PIX. Todo PIX que realizamos hoje é baseado em COBOL. Podemos afirmar que 99,9% dos PIX são processados dessa forma. Pequenos bancos e bancos digitais participam do ecossistema do PIX sem COBOL, mas são a minoria.
Os grandes bancos processam entre 110 a 120 mil PIX por segundo. Para suportar esse volume de processamento, é necessária uma estrutura muito robusta.
Isso envolve controle, registro de logs, auditoria e envio de informações ao Banco Central, que as registra. Quando realizamos um PIX, ele percorre todo o ecossistema, composto por máquinas, 99,9% delas em mainframe, armazenando dados em bancos de dados Db2 e transacionando com o MQ, que é o sistema de mensageria. Tudo isso ocorre em milésimos de segundo.
André: A complexidade do negócio exige uma estrutura muito grande e forte. Apesar do surgimento constante de novas tecnologias e abordagens, as maiores instituições financeiras do mundo continuam utilizando mainframe e COBOL há décadas.
Surge a pergunta: será que o COBOL será substituído algum dia?
Denis: O primeiro curso de COBOL que fiz foi em 1983. Tive a sorte de estudar em uma escola que possuía um modelo pequeno de COBOL, onde programávamos em codificação de papel, perfurávamos cartões, compilávamos e víamos o resultado.
Naquela época, a pessoa instrutora mencionou que aquela seria a última turma, pois a partir do ano seguinte, o foco seria em Java e um pouco de C, já que o COBOL estava, supostamente, em declínio.
Hoje, em 2025, existem 220 bilhões de linhas de COBOL em produção no mundo. Definitivamente, o COBOL não está morto. A previsão estava errada. Embora o Java tenha crescido e muitas novas tecnologias tenham surgido, o COBOL continua vivo.
Ele é fortemente integrado à arquitetura da máquina e possui um desempenho excepcional. Atualmente, temos workloads de Java, Python e C dentro do mainframe, todos operando em conjunto. Um programa COBOL pode chamar C ou Python, e um programa Java no mainframe pode chamar COBOL. A conexão entre o ecossistema de linguagens é nativa na plataforma.
André: O COBOL consegue desempenhar a função de integrar diferentes linguagens, permitindo que especialistas sejam chamados para tarefas específicas.
Denis: É possível ter um módulo especializado em Java que acessa um Db2. Em vez de manter esse componente no COBOL, fazemos uma chamada e o deixamos como um objeto mais especializado, permitindo que outras linguagens também realizem o acesso especializado ao Db2.
André: Estou curioso sobre o mercado em si, no sentido de entrar nele e encontrar oportunidades. Existem muitos perfis diferentes no mundo Dev. Há pessoas apaixonadas por interagir com pessoas usuárias que se dedicam ao front-end, enquanto outras são apaixonadas pelo back-end.
No entanto, parece que, em algum momento, isso se limita às tecnologias que estão em alta no momento, como Java, JavaScript no front-end ou Node no back-end.
O COBOL, apesar de ter muito espaço, nem sempre atrai o público jovem a conhecê-lo, aprendê-lo e trabalhar com seus desafios. Existe alguma hipótese sobre por que isso acontece?
Denis: Acredito que o mundo acadêmico se afastou um pouco do discurso do COBOL. Ficamos muito focados no front-end, na entrega de interfaces gráficas, no uso do mouse e do clique, enquanto ninguém quer a tela escura do mainframe.
É verdade que esse discurso fazia sentido em determinado momento, mas hoje, temos interfaces de desenvolvimento como o Eclipse conectadas ao mainframe.
A pessoa desenvolvedora que faz manutenção nem sabe onde está o sistema. De repente, o servidor mainframe está na China ou na Índia, e nós trabalhamos no Eclipse, trazemos para o nosso workspace, e conseguimos trabalhar sem a preocupação de estar conectados ao servidor do legado.
Não gosto quando o mainframe é chamado de legado; prefiro chamá-lo de core, pois ele não é legado. Nosso fundo de garantia está no mainframe, o PIX roda no mainframe, nossa vida financeira está no mainframe, o serviço social de aposentadoria, de INSS; tudo isso é mainframe.
Quando mencionam a ideia de legado, sempre corrijo dizendo que trabalho com o core.
André: Essa diferenciação é importante, pois quando falamos em legado, pensamos em algo que está para ser substituído ou que está em um canto, difícil de se livrar, mas não o que acontece.
As oportunidades que surgem nesse contexto têm aparecido mais em forma de consultoria ou em vagas dentro de instituições? Como isso funciona?
Denis: Acredito que há as duas possibilidades. Existem clientes que investem em treinamento, colocando estagiários e querendo criar perfis internamente que troquem conhecimento com o pessoal que está prestes a se aposentar.
Há também muitos serviços de consultoria, onde contratam empresas para desenvolver ou melhorar módulos, ou integrar novos módulos, necessitando de equipes para isso.
Portanto, há muitas oportunidades de trabalho, não apenas para pessoas programadoras COBOL, mas também para quem mantém a infraestrutura. Isso inclui quem cuida de Db2, CICS, VSAM, que é o ambiente de segurança.
André: O que acabamos de conversar servirá para expandir a visão de quem está nos acompanhando sobre as diversas possibilidades existentes dentro do mercado.
André: Você mencionou algo que chamou minha atenção, pois diz respeito a uma linguagem que aprecio: o Java, apesar das controvérsias. Também gosto muito do Python, pela facilidade de escrita.
Por meio de pesquisas, descobrimos que a IBM lançou, em 2020, um SDK para o Python rodar no mainframe, algo bastante interessante. A questão que surge é:
Em algum momento o COBOL será substituído? As outras linguagens estão chegando ao mainframe para expulsá-lo, ou são alternativas paralelas ao COBOL?
Denis: A resposta é a segunda opção. Não há nenhuma intenção, nem por parte da IBM, nem de qualquer entidade no mercado, de substituir um aplicativo que possui 20 mil programas em COBOL, com uma média de 4 a 5 mil linhas cada, por Python.
Isso não faz sentido, pois não traria ganhos em performance ou desempenho; apenas geraria riscos de migração e demandaria um tempo enorme de codificação.
Quando falamos de desempenho, o COBOL está longe de estar obsoleto. No mainframe, ele desempenha muitíssimo melhor do que outras linguagens ou arquiteturas que poderíamos adotar.
A única linguagem que supera o COBOL no mainframe é o Assembly, pois, ao programar em Assembly, lidamos diretamente com instruções específicas, conhecendo profundamente a arquitetura, o que o torna extremamente eficiente.
O COBOL, sendo uma linguagem de alto nível, passa por processos de compilação e edição, incorporando um conjunto de instruções para resolver a linguagem, o que o torna extremamente eficiente, pois está muito próximo da arquitetura. Já ao rodar um programa em Python, há sempre uma camada de classes que introduz um overhead de execução. O mesmo ocorre com linguagens nativas, como CLIST, que existe no mainframe, e REXX, que é interpretada.
Jamais conseguiremos ter uma performance no REXX como temos no COBOL, porque a cada linha executada, o interpretador verifica se está correta, se há uma vírgula a mais ou a menos. Esse overhead gera uma latência que não existe no COBOL.
André: Essa resposta é interessante, pois, quando ouvimos de alguém que não trabalha com mainframe ou COBOL, as respostas costumam ser genéricas e, muitas vezes, imprecisas. Não se trata apenas do trabalho de mudar tudo, mas também de questões de performance, desempenho e segurança. No mundo mainframe e COBOL, a segurança é diferente do mundo PC?
Denis: A plataforma mainframe é a mais segura que existe. Não há registros de invasões.
Lembro-me de uma feira de tecnologia há cerca de 15 anos, onde alguém tentou demonstrar uma invasão em mainframe. A pessoa explicou que, ao alterar uma biblioteca do sistema operacional, poderia liberar acesso. No entanto, isso só seria possível após logar na máquina.
A pessoa não mencionou a parte de fazer uma conexão remota, como imaginamos. Não é possível simplesmente entrar por uma porta RJ-45 e causar danos.
A demonstração partia de um logon, onde a pessoa precisava ter um perfil de system programmer com acesso privilegiado para alterar bibliotecas específicas.
Portanto, a plataforma é extremamente segura. Para qualquer componente dessa plataforma, existem regras bem específicas, impossibilitando burlar.
André: Isso explica por que existem mainframes em tantos serviços governamentais e instituições financeiras. Quando tiramos um documento no Poupatempo em São Paulo e tudo acontece rapidamente, por exemplo, os mainframes estão envolvidos nesse processo.
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