Computação quântica: a nova fronteira para o processamento de informações

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Marcel Stefan Wagner
Marcel Stefan Wagner

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A computação clássica, baseada em transistores e arquiteturas digitais, transformou a sociedade em escala global desde a sua implementação.

No entanto, problemas de alta complexidade permanecem inatingíveis até hoje, mesmo com o uso de supercomputadores.  

A busca por novos paradigmas levou ao surgimento da computação quântica, um campo que une física quântica, ciência da computação e engenharia para explorar princípios fundamentais da natureza no processamento de informações. 

Neste artigo, vamos entender os fundamentos da computação quântica, suas arquiteturas, principais algoritmos, aplicações emergentes e os desafios que ainda limitam sua consolidação.  

O objetivo é apresentar uma visão aprofundada desse tema que está moldando o futuro da tecnologia. 

O que é computação quântica? 

A computação quântica é um modelo de processamento de dados que utiliza qubits no lugar dos tradicionais bits 

Enquanto bits podem assumir apenas os estados 0 ou 1, os qubits exploram fenômenos da mecânica quântica: superposição, emaranhamento (*entanglement*) e interferência. 

Propriedades da computação quântica 

- Superposição: fenômeno no qual um qubit pode estar em uma combinação linear dos estados 0 e 1 simultaneamente. Isso significa que um sistema com n qubits pode representar 2n estados ao mesmo tempo. 

- Emaranhamento: neste caso, qubits correlacionados compartilham estados de forma instantânea, mesmo que estejam separados fisicamente, desta forma, permitindo operações altamente interdependentes. 

- Interferência: trata-se da manipulação de probabilidades de forma a reforçar soluções corretas e invalidar as incorretas. 

Essas propriedades tornam a computação quântica extremamente poderosa para resolver certos tipos de problemas, como os relacionados à criptografia e logística, por exemplo, indo muito além da capacidade da computação clássica. 

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Como funcionam os computadores quânticos? 

A estrutura de um computador quântico é formada por circuitos quânticos compostos por portas lógicas que manipulam os qubits.  

Assim como portas lógicas clássicas (`AND`, `OR` e `NOT`) realizam operações básicas sobre os bits, as portas quânticas realizam transformações unitárias sobre os estados quânticos para os qubits

Após a execução de uma sequência de portas, ocorre a etapa de medição, que converte o estado probabilístico dos qubits em resultados clássicos.  

Esse processo, entretanto, acaba sendo destrutivo, pois ao realizar a medição, a superposição colapsa em um único estado, o que exige algoritmos inteligentes para explorar as fases intermediárias antes da medição. 

Arquiteturas de computação quântica 

Várias tecnologias estão em desenvolvimento para implementar qubits de forma prática e estável.  

Cada arquitetura tem suas vantagens e suas limitações, e ainda não há uma tecnologia predominante ou amplamente consolidada.  

O futuro da computação quântica pode envolver uma combinação dessas tecnologias, dependendo da aplicação. Entre elas, podemos citar: 

Qubits supercondutores 

Os qubits supercondutores são utilizados por empresas como Google e IBM, operam em temperaturas próximas ao zero absoluto.  

São baseados em circuitos supercondutores que exibem comportamento quântico em escala macroscópica. 

Íons aprisionados 

Íons presos em armadilhas eletromagnéticas, manipulados por lasers. Oferecem alta precisão, mas enfrentam dificuldades para escalar sistemas com muitos qubits. Já usados por empresas como IBM, Google e IonQ.  

Existem computadores quânticos acessíveis via nuvem como IBM Quantum Experience, Amazon Braket. 

Computação fotônica 

Utiliza fótons como qubits, que são manipulados por divisores de feixe e moduladores ópticos. É promissora para uso em comunicação quântica, devido à baixa interação dos fótons com o ambiente. 

Qubits topológicos e de spin 

Explorando estados mais estáveis, ainda em fase experimental, mas com potencial de maior robustez contra erros. 

Apesar dos avanços, o maior desafio é a decoerência, isto é, a perda de informações quânticas devido à interação com o ambiente.  

Por isso, técnicas de correção de erros quânticos são fundamentais para tornar os sistemas escaláveis e confiáveis. 

Algoritmos quânticos: o diferencial real 

A computação quântica não é apenas mais rápida, mas introduz novos paradigmas de resolução de problemas.  

Ao explorar os fenômenos da mecânica quântica, como mencionamos anteriormente, a computação quântica é capaz de realizar cálculos de maneira fundamentalmente distinta.  

Os algoritmos quânticos abrem portas para novas formas de pensar e modelar problemas, sendo um diferencial da computação quântica em relação à clássica e permitindo que certos problemas sejam resolvidos com uma eficiência exponencialmente maior.  

Alguns dos algoritmos quânticos mais relevantes são: 

Algoritmo de Shor

Este algoritmo é capaz de fatorar números inteiros grandes em tempo polinomial, ameaçando diretamente sistemas de criptografia como RSA. 

Algoritmo de Grover

É um algoritmo que acelera as buscas em bancos de dados não estruturados, reduzindo da ordem de N (O(N)), ou seja, o tempo cresce linearmente com o número de elementos neste caso, para um tempo que cresce com a raiz quadrada do número de elementos (O(√N)). 

Algoritmos de simulação quântica

Simulam sistemas quânticos naturais, aplicáveis em química, física de materiais e biologia molecular. 

Algoritmos híbridos (VQE e QAOA)

São projetados para a era atual dos computadores NISQ (Noisy Intermediate-Scale Quantum), pois combinam processamento clássico e quântico para contornar limitações práticas.

Empresas como Volkswagen, Airbus, JP Morgan e Roche já fazem projetos-piloto com computadores NISQ. 

Com base no exposto, esses algoritmos demonstram que o poder da computação quântica não está em substituir a computação clássica, mas sim, em resolver problemas específicos com desempenho que seria inatingível pelos métodos convencionais. 

Aplicações promissoras da computação quântica

O verdadeiro diferencial da computação quântica não está apenas na velocidade de processamento, mas na forma radicalmente nova como ela aborda a resolução de problemas.  

Como já mencionamos, os algoritmos quânticos exploram qubits, que podem estar em múltiplos estados simultaneamente, graças à superposição.  

Além disso, os qubits podem estar emaranhados, o que significa que o estado de um qubit pode depender diretamente do estado de outro, mesmo que estejam fisicamente separados.  

Esses fenômenos permitem que algoritmos quânticos realizem operações paralelas em uma escala que seria impraticável para computadores clássicos. 

Exemplos de aplicações da computação quântica na prática 

Dessa forma, a computação quântica pode impactar diversos setores estratégicos da sociedade, seja na área de pesquisa, mercado ou indústria, como: 

- Criptografia e segurança: Sistemas clássicos podem ser quebrados por algoritmos quânticos, mas novas soluções como a criptografia quântica prometem segurança baseada nas leis da física. 

- Farmacologia e biotecnologia: Simulação precisa de interações moleculares pode acelerar a descoberta de medicamentos e tratamentos personalizados. 

- Otimização logística e financeira: Resolver problemas complexos de roteamento, escalonamento de produção e precificação em tempo extremamente competitivo. 

- Ciência dos materiais: Desenvolvimento de supercondutores, baterias de nova geração e catalisadores inovadores. 

- Inteligência artificial quântica: Modelos híbridos que unem aprendizado de máquina e algoritmos quânticos, com ganhos potenciais em análise de grandes volumes de dados. 

Essas aplicações ainda estão em estágios iniciais, mas os avanços contínuos em hardware e algoritmos indicam que a computação quântica poderá transformar profundamente a forma como resolvemos problemas complexos nas próximas décadas. 

Desafios e da computação quântica 

Apesar do entusiasmo, ainda há um longo caminho a ser percorrido antes que ela se torne uma tecnologia amplamente acessível e funcional em escala. 

Embora os avanços em hardware e algoritmos sejam promissores, a computação quântica enfrenta barreiras técnicas, científicas e práticas que limitam sua aplicação no mundo real. 

Ainda existe muito a ser feito, pois a computação quântica ainda enfrenta barreiras significativas, das quais pode-se destacar: 

- Correção de erros: atualmente, milhares de qubits físicos podem ser necessários para criar um único qubit lógico confiável. 

- Escalabilidade: construir sistemas com milhões de qubits é uma meta ainda distante. 

- Infraestrutura: exige criogenia, isolamento eletromagnético e componentes de alta precisão, elevando os custos do computador quântico. 

- Formação de talentos: há escassez de profissionais capacitados em física quântica, ciência da computação quântica e engenharia aplicada a computadores quânticos. 

Essas limitações não apenas dificultam a construção de computadores quânticos estáveis e escaláveis, mas também desafiam a integração dessa nova abordagem com os sistemas clássicos já existentes. 

Esses desafios reforçam a ideia de que a evolução será gradual, com computadores quânticos inicialmente atuando como aceleradores especializados, complementando os sistemas clássicos. 

Conclusão 

A computação quântica representa um dos maiores avanços tecnológicos em evolução. Fundamentada em princípios contraintuitivos da física, ela oferece possibilidades inéditas para o processamento de informações.  

Embora ainda não seja uma realidade prática em larga escala, seu potencial já mobiliza governos, empresas e centros de pesquisa em todo o mundo. 

O futuro mais provável será híbrido: computadores clássicos trabalhando lado a lado com dispositivos quânticos, cada um explorando suas forças.  

Com aplicações em criptografia, ciência de materiais, saúde, logística e inteligência artificial, a computação quântica pode redefinir a base tecnológica da sociedade no século XXI. 

Assim como a eletricidade e a Internet transformaram a humanidade, a computação quântica se projeta como a próxima grande revolução tecnológica.  

Desta forma, o que hoje é um desafio experimental pode se tornar, nas próximas décadas, o alicerce de uma nova era da informação. 

Referências 

DEUTSCH, D. Quantum theory, the Church–Turing principle and the universal quantum computer. Proceedings of the Royal Society of London A, v. 400, p. 97–117, 1985. DOI: 10.1098/rspa.1985.0070. 

LADD, T. D. et al. Quantum computers. Nature, v. 464, p. 45–53, 2010. DOI: 10.1038/nature08812. 

MONTANARO, A. Quantum algorithms: an overview. npj Quantum Information, v. 2, p. 15023, 2016. DOI: 10.1038/npjqi.2015.23. 

NIELSEN, M. A.; CHUANG, I. L. Quantum Computation and Quantum Information. 10th Anniversary Edition. Cambridge: Cambridge University Press, 2010. 

PRESKILL, J. Quantum Computing in the NISQ era and beyond. Quantum, v. 2, p. 79, 2018. DOI: 10.22331/q-2018-08-06-79. 

SHOR, P. W. Algorithms for quantum computation: discrete logarithms and factoring. In: Proceedings of the 35th Annual Symposium on Foundations of Computer Science (FOCS). IEEE, 1994. p. 124–134. DOI: 10.1109/SFCS.1994.365700. 

ARUTE, F. et al. Quantum supremacy using a programmable superconducting processor. Nature, v. 574, p. 505–510, 2019. DOI: 10.1038/s41586-019-1666-5. 

Autor

Marcel Stefan Wagner

possui Pós-Doutorado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EPUSP), na área de Engenharia de Sistemas Eletrônicos, sobre Redes Cognitivas, IoT e Smart Cities. É Doutor em Ciências e Mestre em Engenharia Elétrica, área de concentração Engenharia Elétrica de Sistemas Eletrônicos, pela EPUSP. Possui Especialização em Educação a Distância e Graduado em Engenharia Elétrica com ênfase em Telecomunicações pela Universidade Paulista (UNIP). É Editor-in-Chief do Transaction on Biomedical Engineering Applications and Healthcare (TBEAH). Atualmente é Membro da Comissão para Mobilidade da Society of Automotive Engineers (SAE) Brasil e da Comissão de Estudos de Tecnologias Quânticas (CETQ), reconhecida como Comissão de Tecnologia da Informação Quântica (CTIQ) vinculada à Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Leciona atualmente na Faculdade de Informática e Administração Paulista (FIAP) e atua como instrutor na Alura, ambas do grupo Alun e, também, leciona no Ibmec e na École supérieure des technologies de l'information appliquées aux métiers (ÉSTIAM), universidade francesa focada em tecnologia. 

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