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Generalistas vs Especialistas

Quero que você leia atentamente uma fala de Bill Gates:

"Eu acredito que uma das principais razões por que a Microsoft decolou é porque a gente pensava de forma mais abrangente que as outras startups. Nós contratamos não apenas Devs brilhantes, mas também pessoas que tinham uma profundidade no seu campo de trabalho e em diferentes competências. Descobri que esses são os mais curiosos e com mais profundos modelos mentais".

Agora compare com uma fala do Eric Schimidt, que esteve no cargo de CEO do Google por 10 anos:

"Eu hoje sugeriria que a persistência é um preditor de sucesso. A gente busca por persistência. E uma segunda coisa é curiosidade. A combinação de persistência e curiosidade é um ótimo preditor do sucesso de colaboradores na economia do conhecimento."

Notou as semelhanças?

Curiosidade: exploração do conhecimento em diferentes competências.

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Persistência: profundidade e expertise em seu campo.

Isso é profissional em <T> o eixo horizontal e o vertical. Navegar para explorar, e mergulhar para aprofundar. Ou, como carinhosamente chamamos, Dev em <T>.

A combinação dessas características parece antagônica. Afinal, então qual deve ser meu foco agora, me especializar naquilo que já sei, ou explorar algo novo? Ou ainda: é melhor ser generalista ou especialista?

Já aviso que não há resposta certa.

Uma desenvolvedora de software que deseja criar uma startup deve entender suficientemente de negócios, marketing e finanças para gerir seu empreendimento. Se não tiver uma grande habilidade ou profundidade nessas áreas, deve ao menos conhecer o suficiente para poder dialogar com as pessoas capazes de somar competências para um objetivo comum.

E dentro do próprio desenvolvimento de software, mesmo tendo uma profundidade em uma tecnologia, é fácil ver as vantagens de ser uma pessoa capaz de transitar nas demais áreas (as abas do <T>), o suficiente para agregar valores e adaptar modelos de pensamento.

Essa "tradução" de visões sempre esteve na base das ciências e da aprendizagem. São as analogias, a capacidade humana de abstrair noções de um contexto para poderem ser aplicadas em outros, mesmo que inexplorados.

A figura do profissional em <T> vem ganhando força tanto no ambiente profissional quanto na comunidade científica. Contudo, existem contrapontos. Ainda é muito comum que superespecialistas alcancem renome e remunerações maiores, por exemplo. Basta pensar em Medicina. Quer um exemplo? Ortopedista de joelho esquerdo.

Parece engraçado, mas esse é justo o exemplo que Leandro Karnal dá, em um video sobre escolha de carreiras para jovens. Será que precisamos de profissionais da Medicina mais focados ou que conheçam melhor as pessoas como um todo?

Mas faz sentido, certo? E não só na Medicina, como em vários outros campos, e não estamos desmerecendo a importância de conquistas que só foram possíveis graças a alguém que se especializou com um projeto de doutorado com título gigante e subtítulo maior ainda.

Agora você, dev, pergunta: e na tecnologia? Bem, não à toa começamos o artigo falando da Microsoft e do Google.

Se você teve a curiosidade de ver de onde pegamos a fala do Bill Gates, viu que era sobre um dos livros que ele recomendou no ano passado. Range, do David Epstein. Olha como ficou o título da edição em português: "Por que os generalistas vencem em um mundo de especialistas".

Segundo David Epstein, na prática, está havendo uma transição na predileção do mercado de profissionais especialistas para generalistas. Em parte, devido ao aumento da compreensão sobre a incerteza dos cenários em que vivemos: problemas complexos demandam capacidade de abstração, visão sistêmica e pensamento crítico, características que tendem a ser mais presentes em profissionais generalistas, pela amplitude de repertório.

Além disso, são profissionais com uma grande abertura para atuar em processos colaborativos, fortemente demandados em contextos que visam inovação.

Não que especialistas não sejam demandados em processos colaborativos. Ao contrário. Muitas vezes, é justamente colocar sua visão de especialista à disposição de um time multidisciplinar que proporciona essa coalizão de saberes tão necessária para a evolução.

Generalista x especialista

Ao falar sobre o generalista, uma crítica comum é a falta de foco de um profissional que navega de interesse em interesse, sem se aprofundar em nada. Sem praticar aquelas 10000 horas, da teoria de Malcom Gladwell no livro Fora de série - Outliers (uma curiosidade é que uma das histórias que ele usou para exemplificar foi a do Bill Gates!).

Nesse ponto, cabe destacar que o generalista consegue sim realizar esse trânsito, mas ele nem por isso é superficial. Note que tanto o T como o I possuem o eixo vertical. Um generalista pode se aprofundar em diferentes áreas do conhecimento ao longo de sua carreira, somando suas expertises para a ampliação de sua capacidade de identificação e resolução de problemas.

Um exemplo recente são pessoas profissionais de linguística que estão atuando na construção de interfaces conversacionais automatizadas junto com pessoas desenvolvedoras, uma vez que seu conhecimento é essencial para melhorar a experiência do usuário dessas interfaces. A tal humanização da tecnologia de que tanto se fala.

E como os especialistas podem se incluir nesse movimento de mercado para o <T>? Você pode desenvolver mais sua curiosidade. Adquirir conhecimento de outras áreas, o eixo horizontal, pensando no que elas têm a ver com a sua, ou não. Às vezes, até terá insights úteis no próprio aprofundamento pessoal, o eixo vertical. Em especial, as habilidades interpessoais (as tais soft skills) como comunicação, flexibilidade e abertura contribuem bastante como ferramentas e mindset para navegar em outros mares.

Certo ou errado?

Você é quem controla a sua carreira. Mas aqui na Alura temos sim uma opinião bem embasada e formatada: aprofunde-se sim na sua especialização, mas é essencial manter estudos e experiências em áreas diferentes. Acredite, isso vai abrir seu leque de ferramentas.

Sobretudo, bons profissionais devem compreender que o todo é maior do que a soma das partes. Colaborar vai além de estar junto. É cruzar. Implica em aprender e construir de forma integrada. E o saber multifacetado dos generalistas pode proporcionar mais insights, pode até mesmo agir como facilitador na comunicação entre especialistas. A vantagem de um time assim é clara.

Unir curiosidade e persistência. Navegar e mergulhar. Explorar e aprofundar. É deste cruzamento que surge o embrião da inovação.

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